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sábado, 23 de julho de 2011

Erradicar o analfabetismo: uma velha promessa

Se a ideia realmente é extirpá-lo, por que as matrículas na Educação de Jovens e Adultos não param de cair nos últimos cinco anos?



Alto índice de evasão, estrutura física inadequada, dificuldade de acesso aos locais de estudo e programas ineficazes. Resumindo, essa é a realidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Brasil. A combinação desses fatores por anos seguidos acabou conduzindo o país a uma situação alarmante: 57,7 milhões de cidadãos com mais de 18 anos sem Ensino Fundamental completo e cerca de 14 milhões de analfabetos. Ao mesmo tempo, de 2006 para cá, vem caindo o número de matrículas na EJA. Ora, se a ideia é erradicar o analfabetismo, como todo candidato gosta de afirmar em época de eleição, as matrículas nessa modalidade de ensino não tinham de estar aumentando, em vez de diminuindo? A conta não fecha. E deixa no ar outra pergunta: será que estamos desistindo dos nossos analfabetos?

A história recente do Brasil está repleta de iniciativas de combate ao analfabetismo. Nos tempos da ditadura militar, entre as décadas de 1960 e 70, havia o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral). Depois, durante o período da redemocratização, criaram-se cursos supletivos. Na era Fernando Henrique Cardoso, foi a vez do programa Alfabetização Solidária. E, na era Luiz Inácio Lula da Silva, entrou em cena o Brasil Alfabetizado. Todas essas políticas contribuíram, em maior ou menor escala, para a redução da taxa de analfabetismo, que caiu de 39,6%, em 1960, para 9,7%, em 2009 (ano dos útimos dados oficiais disponíveis). Mesmo assim, nenhuma delas evitou que chegássemos à segunda década do século 21 com a vergonhosa marca de 14,1 milhões de analfabetos.
 
Uma contradição preocupante Enquanto as matrículas na EJA caem,os analfabetos são 14,1 milhões* Número de 2010 não divulgado pelo IBGE Fontes: EDUDATA, Censo escolar 2010 E IBGE




Para entender o descompasso entre índice de analfabetismo elevado e queda de matrículas na EJA, é preciso analisar pelo menos dois fatores determinantes. O primeiro deles é a falta de investimentos nessa modalidade de ensino. À época do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), entre 1998 e 2006, as classes de EJA eram bancadas, principalmente, pelo dinheiro de estados e   municípios.

Com a sua substituição pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), em 2007, o Governo Federal passou a ajudar mais. Acontece que o novo fundo, embora preveja o financiamento de todas as etapas da Educação Básica, não determina que parte dos recursos seja necessariamente direcionada às salas de jovens e adultos. O resultado é que, livres da obrigação de investimento, muitos gestores preferem fechar (ou, pelo menos, não abrir) essas salas. Por quê? A explicação é simples: a EJA tradicionalmente apresenta índices de evasão, faltas e repetência mais altos que os das turmas regulares do Ensino Fundamental e do Médio, uma vez que seus alunos, na maioria das vezes, são trabalhadores. Isso significa que, ao não investir na EJA, o gestor corre menos risco de ver a nota de sua escola diminuída quando estado ou município resolvem fazer a avaliação das unidades de ensino. Cria-se, assim, um círculo vicioso que em nada colabora com a meta de erradicação do analfabetismo.
Outro problema é o cálculo do custo anual de um aluno de EJA. O valor mínimo de repasse às escolas previsto pelo Fundeb é, em média, 20% inferior ao que se destina a estudantes dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Aí, abre-se espaço para mais uma pergunta indigesta: será que jovens e adultos analfabetos são 20% menos importantes?

Os especialistas são unânimes ao afirmar que, para virar esse jogo, é urgente promover uma adequação curricular. Hoje, o currículo da EJA não passa de uma adaptação dos conteúdos do Ensino Fundamental. Ao ignorar as necessidades desse público, ele acaba impulsionando a evasão. Também é essencial garantir aos professores uma formação específica para trabalhar com essa modalidade de ensino e extinguir a prática de convocar voluntários - nem sempre bem preparados - para alfabetizar. Os materiais didáticos, também adaptados do Fundamental, devem ser revistos e "desinfantilizados", assim como a estrutura física das salas de aula.

Reverter a situação em que se encontra a EJA exigirá ações articuladas por parte das três esferas de poder - municipal, estadual e federal. Antes, porém, é preciso que promessas de campanha deixem de ser apenas promessas. E que o Brasil decida, de uma vez por todas, se quer enfrentar o analfabetismo ou se prefere esperar que o tempo cuide de extirpá-lo lenta e naturalmente.

Fonte: Revista nova escola

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